terça-feira, 20 de julho de 2010

"Entrevistas que seriam publicadas em um zine de papel, mas que por algum motivo não serão mais"

Essa postagem é a primeira da série "Entrevistas que seriam publicadas em um zine de papel, mas que por algum motivo não serão mais".

São entrevistas que sairiam impressas no zine Distorção, mas demos uma enrolada monstruosa e elas simplesmente ficaram velhas. Para não perdermos as entrevistas, vou aproveitar o espaço do blog pra publicar. Fica aqui registrado nossas desculpas para as bandas e pras pessoas que estavam esperando isso sair impresso.
A primeira entrevista é com a banda The Renegades of Punk, de Sergipe. Ela foi respondida em março de 2009, pela Dani.




1) Velhos, chatos, punks e sem graça. O que é isso? É a idade chegando?

Dani – Totalmente! Mas isso tem a ver também com o que sempre fomos. E acho até que deve ser um pré-requisito básico para qualquer envolvimento com coisas como o “punk”, por exemplo. Ser chato.

2) "Do you think you make any difference? They want you making no difference'. Dá pra fazer alguma diferença nos dias de hoje?

Dani – Sim, sim. Mesmo sendo uma letra irônica, acompanhada logo em seguida de uma música que fala que está cada dia mais difícil ser rebelde, creio que somos ainda bastante otimistas; ainda estamos aqui, tocando e respondendo esta entrevista entre outras coisas...

3) Alguns grupos têm aparecido no cenário com a proposta de fazer um punk rock influenciado por bandas americanas dos anos 80 como X, Dils, Circle Jerks e Avengers. Para vocês, que tem no histórico passagens por bandas como xReverx e Triste Fim de Rosilene, qual foi a inspiração para fazer esse tipo de som?

Dani – Punk Rock. Antes de tocarmos nessas bandas, que eu também considero bandas punks, já ouvíamos punk rock. Foram aquelas bandas clássicas como Ramones e Sex Pistols que me fizeram entrar em contato este tipo de som e me ligar cada vez mais com todo esse lance. Eu tocava em bandas de punk rock antes de tocar sons mais rápidos, daí depois que estas bandas acabaram o surgimento da Renegades surgiu por uma saudadinha aliada a idéias despretensiosas.

4) Ainda sobre a questão musical: vocês acham que o retorno às origens do punk rock seria uma solução criativa para detonar a mesmice criada por uma tonelada de bandas chatas e sem inspiração?

Dani – Não necessariamente. O que rolou na década de setenta e oitenta faz parte do passado. A tentativa de fazer algo parecido sempre soará chata e cretina. Algumas bandas ainda tentam buscar algo que está lá atrás, tudo bem, isso é bem normal quando se trata de inspiração, referência. Quando o lance é buscar uma fórmula correta conseguimos apenas esse cenário o qual você descreveu na tua pergunta: mesmice.

5) “É tudo tão quadrado/ pré-formatado/ estereotipado/ não aprendi a ser original”. Por mais que essa não seja a intenção da letra, vocês acham que o punk rock foi “racionalizado”?

Dani – Tudo foi racionalizado. Desde o lidar com o mundo, o lidar com si mesmo e os outros até as formas de se afastar dessa mesma racionalização. Nosso prazer, gozo, trabalho, alegria e até tristeza é racional. Eu tenho uma visão bem pessimista disso. Não temos como fugir mesmo.

6) Qual a relação de vocês com a música? Quer dizer, vocês já pensaram em fazer música fora do punk? Se sentiriam confortáveis com isso?

Dani – Eu, particularmente, adoro música. Não todos os tipos de música, não. Não sou nem um pouco “eclética” (argh!). Mas consigo passear por algumas searas musicais. Cada vez mais a música é quase uma necessidade fisiológica pra mim. Sim, já pensei nisso sim. Não me deixa nem um pouco desconfortável pensar na possibilidade de, por exemplo, poder trabalhar com música. Seria perfeito! Preferiria milhões de vezes ter de encarar diariamente uma coisa tão prazerosa e onde você pode trabalhar com sensações, emoções, criatividade e etc, do que fazer um trabalho igual e estéril.

7) Sobre a quantidade pequena de meninas no punk, meninas que montam banda, que organizam shows, que vivem o que vale a pena viver no punk. A Carla (True Lies Zine) me perguntou sobre isso e eu penso que essa discussão que está acontecendo, sobre desconstrução de gênero, é o caminho pra mudar. Qual a idéia de vocês sobre tudo isso?

Dani – Esse lance de desconstrução de gênero é algo muito complexo... Mas ao mesmo tempo me inquieta há anos essa diferença quantitativa no numero de garotas ativas no punk – e em outros âmbitos também. Eu já pensei muitas coisas diferentes ao longo desses anos. Já tentei diversas formas de aproximação com outras garotas, por exemplo. É difícil... Talvez seja até simplista, se é que esta palavra cabe aqui, cair na dicotomia dominado/dominador, sociedade má/homem naturalmente bom... Talvez o punk não interesse mesmo tanto assim as garotas... Confesso que vivendo isso diariamente aqui na minha cidade, vivendo e vendo o total desinteresse mesmo quando se tem tudo ao alcance das mãos, isso tudo só me faz ficar mais sem respostas. Mas uma coisa eu posso afirmar com essa mínima “experiência”: é muita ingenuidade achar que as meninas não se movimentam apenas por que o machismo impera. Sabemos que nossa sociedade não é uma sociedade de iguais. Que existem parcelas da população que sofrem abertamente com vários tipos de preconceito/discriminação, mas é, por outro lado, muito ingênuo achar que tudo é culpa dos outros, que é tudo social. Não estou negando a importância da socialização e o papel que as instituições sociais têm. A questão deve continuar a ser debatida, mas muito mais do que isso vivida. Se a desconstrução de gênero foi algo eficaz, útil, que seja tentada ao menos. Mas muito mais do que filosofar sobre temos mesmo é que pegar um instrumento e tocar, se esse for o caso. Não é apenas tendo um zine ou estando em uma banda que uma garota pode participar da “cena” ou contribuir de alguma forma com o punk, não é? Às vezes também parece que vira uma regra: se você é garota e está no punk tem que ser ativa, política, ter banda feminista etc. Se o mesmo padrão fosse “imposto” aos caras, e isso fosse uma regra, o contingente masculino ia diminuir drasticamente também.

8) Fiquei sabendo que iria rolar uma turnê pelo sudeste final do ano passado (me corrijam se eu estiver errado). O que aconteceu? Há planos pra esse ano?

Dani – Isso mesmo, você está certo. Estávamos nos programando e tínhamos os shows fechados. Tínhamos uma certa antecedência e tudo mais, mas devido à falta de promoções áreas, e outras coisinhas a mais, não rolou infelizmente. Moramos longe e isso dificulta um pouco a locomoção para estados mais afastados como os do sudeste. Mas temos planos para este ano sim. Queremos também passar pelo nordeste – não na mesma época. Este rolê para o sudeste deve acontecer no segundo semestre, ou logo no início ou no meio do segundo semestre deste ano.

9) E como anda o Barulho de retardado? É apenas um nome pra juntar as coisas ou a idéia é mesmo lançar materiais? Desanima vocês essa pouca fama dos CDs?

Dani – A Barulho de Retardado somos Eu, Ivo e Aquino Neto. A idéia é sim lançar materiais nossos e de bandas que a gente curte. No ano passado lançamos o primeiro EP da Renegades, acabamos de lançar – junto com outros selos – um álbum virtual (“Mamparra”) de uma ótima banda daqui de Aracaju chamada Perdeu a Língua e para os próximos meses temos dois lançamentos para sair: um split da Mahatma Gangue (RN) com a R.O.P. e uma demo de outra banda daqui chamada The Jezebels. Esse lance do desanimo das pessoas com material é chato, mas normal até. Isso não é tanto um problema, cada vez mais as coisas estão mais fáceis, mais à mão e fica cada vez menos complicado fazer as coisas, produzir um material, gravar algo... Além disso, sempre têm os que realmente querem ter cds, camisetas e não apenas mp3 - nada contra as mp3, por favor! Todo mundo que lança algum material hoje em dia sabe com o que está lidando, para nós não é nenhuma novidade, sabe? Mas como eu disse lá no início, apesar de tudo ainda somos otimistas, né? Fazer o quê?

Fotos retiradas do myspace da banda: www.myspace.com/therenegadesofpunk

Um comentário:

xEduardox disse...

"é muita ingenuidade achar que as meninas não se movimentam apenas por que o machismo impera."

Concordo plenamente, e hoje no buzão estava refletindo sobre isso. O porque do desinteresse das meninas no hardcore/punk, ainda não cheguei a nenhuma conclusão, mas continuarei refletindo sobre...Mas atualmente acho que o desinteresse é geral. Garotas e Garotos.