terça-feira, 3 de agosto de 2010

Entrevista com D.E.R - segunda parte das entrevistas esquecidas

Continuando com a série, temos uma entrevista com a banda D.E.R, de São Paulo. A entrevista é de março de 2009. Eu gostei demais da entrevista e é uma pena não ter saído em papel.
Perguntas feitas por John e Fernando.




1) Achei interessante o título do trabalho mais recente de vocês. Quando a esperança desaba, sobra o que? Pessimismo?

Thiago: Sim e não. Na verdade é um momento de pessimismo e não algo que sempre carregamos pela vida, não somos pessoas pessimistas mas existe situações e momentos que são uma merda e que nos deixa em um beco sem saída.Mostrando isso que te falei na letra “quando a esperança desaba” tem uma parte que diz assim: - “Ainda há uma razão, mesmo que tudo se torne impossivel e que não exista possibilidades”... Ou seja ainda existe uma razão para se continuar lutando todos os dias.

Renato: Se refere a verdade, não a verdade imposta, mais aquela que faz parte da sua realidade de vida! retrata um ponto caótico, sobre suas possibilidades reais de sobrevivência, o fato não é viver bem, mais sim sobreviver de forma digna! Sobre os dogmas religiosos isso seria um milagre, mas milagre mesmo é ver o cidadão acordar de madruga trabalhar 12 horas por dia, ganhar um salario minimo e sustentar uma familia inteira.
E mesmo sem esperança de um futuro promissor, sem esperança de porra nenhuma mas sempre com dignidade e carater.
Quando a esperança desaba, não lhe resta mais nada a não ser continuar a tentar! sem deus, sem mentiras apenas você e suas possibilidades reais de sobrevivência!

2) Olhando pelo lado político: no split com o Morte Asceta, há uma música (Tolo Regresso) na qual vocês falam que acreditam em "revoluções comunitárias". O que seriam essas “revoluções” e como vocês avaliam os movimentos sociais no país hoje?
Thiago: Quando falamos “Revoluções Comunitárias” estamos remetendo ao que vivemos alguns anos atrás, que só poderíamos sair dessa merda se todos estivessem juntos, que somente juntos poderíamos mudar as coisas. Hoje em dia vejo que alguns movimentos trabalham em modo passivo, sucetivo a negociações e o que eu chamo de “luta leve”. Claro que isso não é uma regra geral. O que me incomoda hoje é a passividade das coisas, é você conseguir 30% do seu objetivo e achar que está bom.

Renato: Sim! Existem muitas coisas que precisam ser feitas. Me pergunto isso com muita frequência, falta a população acreditar que é possivel, precisamos de determinação e coragem, é uma regra clara.

3) “Isso nunca existiu, assim como a vontade de justiça social”. Nunca existiu para quem? E justiça social seria mesmo “Dinheiro para todos”, como dizem por aí?

Thiago: Nunca existiu para pessoas que pensam de forma assistencialista. Caridade não é justiça social, dar brinquedos no natal não é justiça social, dar um emprego de 14 horas de serviço e 4 horas de transporte público precário com um salário de merda não é justiça social. Não é questão de dinheiro é questão de chance, é questão de dignidade.

4) Na opinião de vocês, qual a relevância do punk nos dias de hoje? Seria apenas o legado “DIY”? Como vocês definem as mudanças que ocorreram no estilo ao longo dos anos?

Thiago: Mudou muita coisa né? Mas pensando bem não foi o punk que mudou, acho que foi o ponto de vista das pessoas sobre o punk. Pelo menos foi assim comigo. Quando conheci o punk pra mim era só um visual para chocar vizinhos e parentes, depois vi que era algo maior. Nos anos 80 a coisa era mais na lâmina da faca!Nos anos 90 ninguém sabia o que estava fazendo e em 2000 é a época de aquarius do punk eheheh. Aprendemos muita coisa com o punk, posso dizer que meu carater é lápidado em cima disso. Hoje estamos mais próximo do “faça você mesmo” e da insurgência.

5) No início, a banda começou tocando punk rock com influência das bandas nacionais dos anos 80. Chegaram inclusive a tocar na carroceria de um caminhão em um festival na periferia de Sp. Como foi a transição até chegar ao som Grind dos dias de hoje?
Renato: Tocavámos punk rock porque era o que ouviamos com mais frequência, e foi onde percebemos que cada pessoa pode fazer sua parte não se importando com resultado, o importante era estar ali tocando, expelindo raiva. Chegamos no grind naturalmente, fomos conhecendo novas bandas, idéias e técnicas e deu no que deu.
Thiago: Essa transição do Punk Rock para o Hardcore deu uma dor de cabeça pra gente, por que chegaram a nós chamar de traidores! Porque estavámos tocando músicas mais rápidas e não dava mais pra fazer pogo cigarrinho ehehehe
Renato: ehehehe é verdade. Hoje ainda temos esse tipo de especulação de que agora somos banda de metal e não banda punk. Sempre tem alguém que comenta que era mais legal punk e outro que é mais legal agora.

6) E o video clipe da música “Empregando o capital”. Como surgiu a idéia de fazer?
Thiago: A idéia foi toda do Pierre (Constrito/Ruina). Ele tem bode de clipe de bandas de hardcore porque ele acha todos parecidos. A idéia inicial era pra ser algo meio gummo/madmax mas o tempo foi passando e não iriamos conseguir fazer a produção disso então resolvemos fazer algo meio tradicional mesmo. A inspiração do clipe veio de uma banda de Dance Music... não lembro o nome... Enfim a idéia gummo/madmax ainda esta de pé e vamos fazer no próximo material.

7) Como vocês avaliam o cenário do grind e da música extrema no país, atualmente? A qualidade das bandas nacionais nesse estilo é satisfatória?

Thiago: É uma cena pequena mas com bandas acima da média. Eu sempre digo que as melhores bandas de grind do mundo estão no Brasil, a coisa aqui é mais selvagem. Deve ser a mistura do calor com a raiva das coisas erradas que aqui existem.

8) Esse é para o Thiago (vocalista). Como é manter o selo Cospe Fogo em uma época de “downloads desenfreados”? A chamada “crise fonográfica” já atingiu o cenário independente?

Thiago: Com certeza, mas tem um lado bom ai... Acho que hoje todo mundo tem acesso a tudo, acesso a discos lançados anos atrás e novas bandas. É um preço que se paga por isso.Acho que o CD terá um fim trágico pelo menos para cenário independente pois o custo de se fazer está muito elevado ao contrário do Vinil que deve voltar com tudo, vamos ver no que vai dar. Os selos devem trabalhar em outras caminhos como shows, camisetas, sites talvez isso torne a coisa sustentável novamente.



9) Thiago, em breve você vai ser pai. Você acha que é possível falar de paternidade sob um ponto de vista "punk"?

Thiago: Com certeza! Tudo que vou fazer para meu filho eu analiso de um ponto de vista punk, desde a escola que ele vai estudar até a fralda passando pelas roupas. Quando você é pai você tem que analisar todos os aspectos para que seu filho não seja um merda quando crescer. Eu não sou o único pai da banda, o Henrique tem dois filhos e os dois são vegans e sugar free! Tenho pego algumas dicas com ele e ficamos trocando informações. Esses dias fomos ver roupas para crianças e que porra... todas as roupas tem um personagem estúpido ou uma frase cristã... é foda. Eu quero que meu filho não seja influenciado com isso ou vire um outdoor da disney.

10) Sobre zines. Vocês fazem ou já fizeram algum? Costumam ler hoje em dia? Sentem falta daquela número enorme de zines dos anos 90?

Thiago: Eu costumo ler, tenho uma pilha deles o Henrique tbm. Sinto falta sim, era foda. As pessoas têm preguiça de escrever e pensar hoje. Eu já tive um zine com o cara da banda Autogestão no final dos anos 90 chamado conjuntura zine, era divertido e trabalhoso, eu curtia.

11) Espaço livre para a banda fazer seus comentários finais.
Thiago: Assustador é quando se descobre que tudo dá em nada. Obrigado John e Nate.Renato: Valeu, grindabraço!

Fotos retidadas do myspace da banda: www.myspace.com/derpunk

Um comentário:

Provos Brasil disse...

Ótima entrevista!!!

Provos Brasil